Enquanto governantes e negociadores internacionais se reúnem no espaço oficial da COP30, a oito quilômetros dali, na Universidade Federal do Pará (UFPA), milhares de indígenas, quilombolas, ribeirinhos, entre outras comunidades tradicionais, se mobilizam na chamada Cúpula dos Povos, que traz a voz dos excluídos à agenda climática. São populações vítimas dos eventos extremos e, ao mesmo tempo, proponentes de soluções para o combate às mudanças do clima. O evento paralelo à conferência da ONU volta a acontecer após três edições de ausência forçada pela legislação proibitiva das sedes das últimas conferências: Egito, Emirados Árabes Unidos e Azerbaijão.
A cerimônia de abertura, no final da tarde de quarta (12), teve shows, lançamentos de livros, debates e um lançamento oficial da Cúpula no palco, onde movimentos gritaram palavras de ordem. Da parte indígena, a de maior peso, a principal pauta era a demarcação de terra.
— Estamos aqui para defender nosso território. A resposta somos nós; só o conhecimento ancestral vai paralisar a crise climática — afirmou o líder indígena Takak Xikrin.
Outra atração da abertura foi um cortejo artístico, organizado por Auto do Círio, UFPA e a Aliança Potência Energética, com a encenação da passagem de uma Boiúna, a cobra gigante dos fundos do rio, que é uma lenda popular da Amazônia e representa a abertura do caminho e a boa energia. À frente, vinham pessoas fantasiadas de onças, as protetoras da floresta.
/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2025/i/R/OgwrzkSvWKT5ISNkgBDQ/whatsapp-image-2025-11-12-at-20.51.13-2-.jpeg)
A Cúpula dos Povos foi criada em 1992, durante a Rio-92, que foi a pedra fundamental das COPs. Na edição de Belém, são esperadas pelo menos sete mil pessoas, que vão ocupar o campus Guamá da UFPA, onde foram instaladas diversas tendas, palcos e espaços para debates, encontros e shows artísticos, além de alojamentos temporários.
Assim, o campus da UFPA foi tomado por uma confluência de movimentos sociais, culturais, reivindicações, propostas e encontros. Era possível encontrar indígenas conversando com quilombolas, assistir a debates dos atingidos por barragens, acompanhar protestos de estudantes e consumir produtos vendidos pelo Movimento dos Sem Terra. A seara de povos que se une em torno de um objetivo em comum: proteger seus territórios e contribuir para a salvação do planeta.
Cerca de 5 mil pessoas chegaram, na manhã dessa quarta-feira, à UFPA em uma barqueata que reuniu 200 barcos na Baía de Guajará. No movimento, havia uma embarcação que veio de Mato Grosso, por exemplo.
A Cúpula dos Povos reúne pautas próprias dos diferentes grupos, mas elege algumas reivindicações prioritárias: justiça climática global, proteção dos direitos humanos, transição energética e valorização da agroecologia.
Além de movimentos sociais, estão presentes instituições do governo federal. Uma é a Fiocruz, que participa da COP30 e da Cúpula dos Povos, principalmente sob o aspecto do impacto das mudanças climáticas na saúde. A Fundação vem atuando, por exemplo, nos debates e programas sobre perda da biodiversidade, poluição, uso de agrotóxicos e a exposição ao mercúrio.
— Essa agenda tem valor fundamental, porque não há mais como fazer saúde e organizar o SUS sem levar em consideração a mudança do clima. O diálogo que construímos teve repercussões fortes na organização dos movimentos sociais nos territórios, nas periferias urbanas, nos campos, florestas e água. Tudo impacta a saúde: o aquecimento da Terra, os eventos extremos, a escassez de alimentos e a ausência de políticas públicas resultam em perda da qualidade de vida — afirmou Guilherme Franco Netto, coordenador de Saúde e Ambiente da Vice-Presidência de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde da Fiocruz.
/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2025/Y/j/dZscYyTKSTFv2mjZOvOA/whatsapp-image-2025-11-12-at-20.51.13-1-.jpeg)
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) estima mais de 2,5 mil indígenas em Belém, entre outras lideranças, cobrando maior representatividade nas negociações e a inclusão da demarcação de terras como política climática.
Mais de 300 representantes dos povos Kayapó, Panará, Tupinambá, Arapiuns, Munduruku, Borari, Mura e outras etnias do Cerrado e da Amazônia, além de agricultores familiares, quilombolas e comunicadores populares, chegaram a Belém numa embarcação chamada Caravana da Resposta, partindo do Baixo Tapajós, região marcada por portos e hidrovias.

