O que fazer quando a criança diz que não tem amigos?

por Assessoria de Imprensa


Dúvidas da semana 🤷‍♀️🤷

  1. Minha filha de 8 anos muitas vezes diz: “Não tenho amigos, ninguém gosta de mim”. Em alguns casos, aceita certos comportamentos das amigas com medo de perder a amizade. Como melhorar essa autoestima?
  2. Como lidar com o filho de 10 anos que se sente rejeitado pelos amigos da escola?
  3. O que falar para sua filha de 11 anos quando ela está sendo excluída pelas colegas e se julga por não ter “uma única melhor amiga”?

Recebemos três perguntas muito parecidas de diferentes leitores. E eu garanto que você ou algum cuidador que conhece já passaram por isso.

Quando escutamos uma criança dizer “ninguém gosta de mim” ou “não tenho amigos”, a dor dela bate direto em nós. Aí vem aquele turbilhão de dúvidas como “devo procurar os pais e mães das outras crianças envolvidas para falar sobre isso?”

Entre a vontade de proteger e a necessidade de deixar que eles próprios construam repertório emocional, ficamos nesse território delicado.

As especialistas que ouvimos trazem caminhos para lidar com exclusões e inseguranças.

Espero que as reflexões ajudem você a respirar fundo, compreender o cenário e acompanhar sua criança. Não para resolver por ela, mas para que ela se sinta capaz de resolver com você por perto.

Se você tem dúvidas na criação de crianças e adolescentes e quer que a gente vá atrás das respostas, veja como enviar sua pergunta ao final desta reportagem.

Palavra das especialistas 👩‍🏫👨‍🏫

Renata Ishida, psicóloga, gerente pedagógica do LIV e co-apresentadora do videocast Sinto que Lá Vem História

🧩 Perguntas de diferentes lugares, mas com uma única preocupação: a solidão da criança/adolescente. Será que meu filho não tem amigos? Será que está com problemas de socialização? Até que ponto é importante que se vire sozinho? E quando (ou se) devo interferir?

🌱 Sabemos que vínculos sociais são fundamentais para o desenvolvimento integral das crianças. É a partir deles que se tem a oportunidade de ampliar as visões de mundo, de conhecer mais sobre si, de estimular a comunicação, a sensibilidade, o respeito e tantas outras questões que somente nossa família não será capaz de nos despertar. Por isso, a preocupação é legítima e esperada.

💔 É muito difícil ouvir de um filho a experiência de uma exclusão. Ninguém quer assistir de fora à dor social de quem ama. A vontade, nessas horas, principalmente quando a criança é mais nova, é prontamente intervir. Mas, se os adultos sempre estiverem presentes mediando as relações, os vínculos nunca acontecerão de fato, e todo um repertório emocional que poderia ser criado acaba não tendo oportunidade de se desenvolver.

🤗 Isso não significa que devemos ignorar essa situação. Quando eles verbalizam um incômodo ou tristeza, o acolhimento é muito importante. Ou seja, nesse momento, importa mais o que ela está sentindo do que o que aconteceu de fato. Um tempo de qualidade para uma escuta interessada e atenta pode ser exatamente o colo que estava buscando.

🔍 Depois do acolhimento, é hora de ajudar a diferenciar sentimento de fato. Sentir-se sozinho não significa ser sozinho. Muitas vezes, conflitos pequenos são vividos como rejeições totais. Ao conversar com calma e reconstruir a situação, o adulto pode oferecer uma lente mais ajustada, que impede conclusões precipitadas e ajudam na persistência em tempos tão voláteis, em que tudo é descartável.

🚨 Por outro lado, insistir em situações que fazem mal apenas para manter-se no grupo é um sinal de alerta grave. O adulto pode ajudar a criança e o adolescente a lembrar que existem limites que precisam ser respeitados e que os mesmos não são negociáveis, nem mesmo para conquistar amigos. E deve intervir quando entender que há riscos.

🏡 Vale conversar com a escola e/ou instituição, caso as relações aconteçam dentro de algum espaço mediado, para entender como melhor realizar esse movimento. Lembrando aqui que as famílias das crianças que realizam violências também precisam estar atentas e fazer as intervenções necessárias.

💞 É importante ampliar a noção de amizade quando a criança ou pré-adolescente deseja ter “uma melhor amiga” como garantia de pertencimento. O adulto pode reforçar que vínculos mudam ao longo do tempo e que ampliar o próprio círculo é saudável, uma vez que uma só pessoa não dá conta de todas as necessidades afetivas. Cada amizade tem um valor único, e ninguém precisa gostar exclusivamente da gente para mostrar que gosta de verdade.

🌈 Oferecer novas oportunidades de convivência também é uma dica preciosa. Nem tudo vai ser resolvido dentro do mesmo círculo social. Atividades fora da escola e esportes, por exemplo, ampliam as oportunidades de novos vínculos e a diversidade de experiências, ajudando a criança a experimentar relações mais saudáveis.

🏙️ Posso estar sendo repetitiva, mas é importante lembrar que vivemos um tempo marcado por um individualismo crescente, que tem enfraquecido a convivência cotidiana, diminuído as brincadeiras coletivas e aumentado a sensação de solidão. Isso faz com que a socialização na infância e adolescência, que já têm seus próprios conflitos, ganhe novas complexidades, que precisamos olhar. E investir nos encontros presenciais faz toda a diferença!

🔄 No final das contas, relacionar-se nunca será isento de sofrimento e desafios. Acompanhar as alegrias e sustentar as tristezas desse caminho é o apoio que os filhos precisam. Lembrá-los de que a amizade é um investimento, mas também pode não ser eterna: ela muda, se aproxima, se afasta. E isso não é um fracasso, é apenas a vida acontecendo. A amizade não é um prêmio, mas um encontro de carinho, curiosidade e respeito pelo outro.

Psicóloga recomenda que os pais valorizem conquistas reais e incentivem a criança a perceber suas qualidades concretas — Foto: Freepik
Psicóloga recomenda que os pais valorizem conquistas reais e incentivem a criança a perceber suas qualidades concretas — Foto: Freepik

Mônica Donetto Guedes, psicanalista e orientadora parental, especialista em gestação e maternidade

🧠 Quando uma criança diz que “ninguém gosta de mim” ou acredita que está sendo rejeitada ou excluída, ela está revelando uma insegurança sobre quem é e sobre como se sente nos grupos. Às vezes isso nasce de brigas ou instabilidades nas amizades; outras vezes vem da maneira como ela interpreta essas situações. Em todas as idades, esse sentimento mistura baixa autoestima, medo de perder vínculos e dificuldade de entender os movimentos naturais dos relacionamentos.

💬 O primeiro passo é sempre o acolhimento. Ouvir com presença, sem minimizar, ajuda a criança a organizar experiências que, para ela, parecem confusas e intensas. Perguntas simples, como “O que aconteceu?”, “Como você ficou?” ou “Que nome daria para esse sentimento?”, permitem que ela encontre palavras para a própria dor e compreenda melhor o conflito entre o que deseja e o que teme.

👧🏽 É fundamental ajudar a criança a entender a dinâmica do grupo sem transformar tudo em culpa pessoal ou culpa dos outros. Explorar juntos o que aconteceu, quem são os colegas, como funcionam as lideranças, o que o grupo valoriza e o que ela mesma tem a oferecer amplia a visão sobre a situação e reduz a ideia de que toda frustração é rejeição.

🛠️ Outro ponto central é construir recursos internos. Valorize conquistas reais, elogie de forma específica e incentive a criança a perceber suas qualidades concretas: “Admiro sua curiosidade em aprender coisas novas” ou “Você tem um talento especial para fazer os outros se sentirem incluídos”. Ao mesmo tempo, ajude-a a ensaiar pequenas respostas, como dizer: “Não quero que fale comigo desse jeito” ou “Não gostei disso”, criando em casa um ambiente seguro para experimentar limites, pedir para participar de brincadeiras ou expressar o que sente.

🏡 Em paralelo, vale observar como a criança lida com frustrações em casa: como busca consolo, como reage aos “nãos”, como expressa incômodos. Esses momentos também moldam a autoestima e preparam para os desafios sociais. Pequenos contratempos, acompanhados de apoio (mas não solução imediata), fortalecem resiliência e autonomia.

👥 Construir oportunidades de convivência fora do contexto difícil também ajuda: um curso de arte, esporte ou teatro, um encontro com colegas em casa, novas experiências de grupo. Isso amplia a rede de pertencimento e permite que ela se veja valorizada em outros ambientes.

🏫 Por fim, uma parceria ativa com a escola é essencial. Conversar com coordenação e orientação sobre a dinâmica da turma, entender como ela está se integrando e quais estratégias a escola usa para trabalhar amizade, conflitos e pertencimento ajuda a alinhar apoios e garantir que ela se sinta segura nos dois espaços: casa e escola.

🗨️ Com constância, escuta e presença, a criança começa a construir um repertório emocional: nomeia o que sente, diferencia o que é dela e o que é do outro, entende que um afastamento nem sempre significa rejeição e aprende a se posicionar com mais confiança nas relações. É esse processo, repetido no dia a dia, que fortalece sua identidade e suas amizades.

DESCOMPLICA: um resumo do que dizem as especialistas 💭

✨ Acolhimento vem primeiro: criar um espaço seguro para a criança falar, sem minimizar o que sente, ajuda a organizar emoções intensas e a entender melhor o que realmente aconteceu.

🌧️ Sentir-se só ≠ ser só: adultos podem ajudar a distinguir sentimento de fato, evitando leituras catastróficas. Pequenos conflitos não significam rejeição total e afastamentos fazem parte do fluxo natural das amizades.

🌱 Autonomia nas relações é essencial: intervir o tempo todo impede que a criança desenvolva repertório emocional. É preciso permitir que ela tente, erre, aprenda e se posicione com apoio, não com soluções prontas.

💪 Construção interna fortalece a convivência: trabalhar autoestima, reconhecer qualidades concretas, praticar limites e oferecer oportunidades externas (novos grupos, atividades, esportes) ampliam o senso de pertencimento e reduzem a dependência de um único círculo social.

🚦 Adultos devem observar, não vigiar demais: há momentos de intervir, especialmente diante de riscos ou violências, e a parceria com a escola é crucial. Mas vínculos mudam, amizades não são eternas e isso não é fracasso: é vida acontecendo.

No radar: 5 livros para ler com as crianças e que ajudam a conversar sobre sentimentos e amizades 📚

1. Fora do pote (VR Editora), de Deborah Marcero (autora) e Fabrício Valério (tradutor): Leocádio não gosta de se sentir com medo, triste, irritado, solitário ou envergonhado. Então, ele tem uma ideia brilhante: guardar cada um de seus sentimentos em potes, que serão escondidos para não incomodá-lo.

2. Emocionário: Diga o que você sente (Sextante), de Cristina Núñez Pereira e Rafael R. Valcárcel (autores) e Rafaella Lemos (tradutora): Um dicionário de emoções que nos ajuda a entender melhor o que sentimos. Para crianças de todas as idades aprenderem a reconhecer suas emoções e expressar seus sentimentos.

3. Filhote de cruz-credo (Bertrand Brasil), de Carpinejar (autor) e Sandra Lavandeira (ilustradora): Carpinejar já viveu infeliz, já viveu isolado, já viveu sem amigos, já viveu não querendo ir à escola para não sofrer nenhum deboche. Mas percebeu que, ao contar a tristeza, ela diminui. Ao não contar, ela aumenta.

4. Eu não ligo! (Caminho Suave), de Julie Fogliano (autora), Molly Idle e Juana Martinez-Neal (ilustradoras) e Camila Werner (tradutora): Duas meninas se encontram pela primeira vez. A princípio, elas se estranham. Mas, pouco a pouco, vão descobrindo que não ligam nem um pouco para as pequenas coisas que as diferenciam.

5. A menina furacão e o menino esponja (Moderna Literatura), de Ilan Brenman (autor) e Lucía Serrano (ilustradora): Ela é expansiva e otimista. Ele é retraído e ressabiado. Um apelo genuíno ao que temos de riqueza maior: a troca de experiências.

Envie a sua pergunta e nós vamos atrás de respostas



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