O Ato Institucional de número 5 (AI-5) é o decreto mais conhecido da ditadura. Mas o regime militar editou 17 atos institucionais, entre 1964 e 1969, para oficializar suas rasteiras na democracia. Um dos mais cruciais foi o Ato Institucional de número 2 (AI-2), publicado há exatos 60 anos, quando o então presidente, marechal Humberto Castelo Branco, tomou para si poderes extraordinários com o pretexto de acabar com a ameaça da subversão. Com aquele ato, o chefe do Executivo impôs uma série de mudanças na legislação a partir de 27 de outubro de 1965. Mas que mudanças foram essas?
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O AI-2 tirou dos brasileiros o direito de escolher o presidente do país, que passou a ser definido por eleição indireta, realizada no Congresso Nacional, então dominado por parlamentares aliados do regime (grande parte da oposição tinha sido cassada após o golpe de 1964). Além disso, o decreto elevou o número de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) de 11 para 16. Como os novos membros foram nomeados por Castelo Branco, o governo obteve a maioria na Corte. Assim, garantia que suas decisões não seriam revertidas pela Justiça. O autoritarismo já tinha método.
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Em 2004, o então presidente da Venezuela, Hugo Chavez, aumentou a quantidade de cadeiras no Supremo Tribunal de Justiça de 20 para 32, com o mesmo objetivo de aumentar sua influência na mais alta corte do país. Seguindo o exemplo dele, bolsonaristas também trabalharam para aumentar o número atual de ministros do STF de 11 para 15, durante o governo do ex-presidente, que, então, poderia escolher todos os novos integrantes. Depois que perderam a eleição, o assunto morreu.
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O decreto de 1965 também extinguiu o pluripartidarismo. Ficaram só a Aliança Nacional Renovadora (ARENA), aliada do governo militar, e o Movimento Democrático Brasileiro (MDB), que aglutinou os parlamentares remanescentes da oposição, após as cassações. Dessa forma, o regime autoritário mantinha uma “aparência” democrática. Ao mesmo tempo, o AI-2 estabeleceu que o governo poderia decretar estado de sítio por até 180 dias sem sequer pedir permissão ao Congresso, por motivos de “segurança nacional”. O ato autorizava ainda o Planalto a intervir nos governos estaduais e a ordenar o recesso do Congresso, bem como demitir servidores “incompatíveis com a revolução”.
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Uma série de eventos levou à edição do infame AI-2. Quando tomaram o país com o golpe de 1964, os militares prometeram que o governo deles seria passageiro. Castello Branco convocaria eleições em outubro de 1965 para para entregar o seu cargo, em janeiro de 1966, a um líder escolhido pelas urnas. Os generais “mudaram de ideia” no meio do caminho, como se sabe, mas permitiram eleições diretas para os governos estaduais (outra vez, preocupados com o “verniz” de democracia). Equivocados, achando que tinham o povo a seu lado, eles esperavam vitória acachapante dos candidatos apoiados pelo regime em todas as unidades da federação, mas não foi bem isso o que aconteceu.
A oposição venceu em cinco estados, entre eles a Guanabara, que em 1975 seria fundida ao Estado do Rio, e Minas Gerais. Enquanto Francisco Negrão de Lima (PSD/PTB) foi eleito na Guanabara, Israel Pinheiro (PSD) venceu em Minas. Ambos eram ligados ao presidente deposto em 1964, João Goulart. Inconformados, os militares apertaram o cerco. Primeiramente, veio o AI-2 e os atos complementares. Em 5 de fevereiro de 1966, foi editado o AI-3, definindo que também os governadores passariam a ser eleitos por via indireta, nas assembleias legislativas. Eram os chamados “governadores biônicos”. Ou seja, os generais gostavam de deixar o povo escolher, mas só quando escolhia os amigos deles.
O Ato Institucional-2 foi anulado em 15 de março de 1967, com a entrada em vigor a nova Constituição Federal e a Lei de Segurança Nacional, ambas impostas pelos generais, que só abririam mão do poder em 1985, quando Tancredo Neves e José Sarney foram escolhidos pelo Colégio Eleitoral. Em 1988, o Congresso Nacional aprovou a Constituição atual, que, enfim, reinstaurou a democracia no Brasil.

