Uma mulher foi presa no domingo (19) sob suspeita de proferir injúrias racistas contra um jogador menor de idade durante uma partida entre Manthiqueira e Corinthians, pelo Campeonato Paulista sub-12 –jogadores com no máximo 12 anos de idade.
Casos de racismo e outras ofensas de torcedores dirigidos a jogadores em partidas de categorias de base têm sido recorrentes no estado de São Paulo nos últimos meses, com ações da FPF (Federação Paulista de Futebol) para tentar coibir as práticas.
O caso dessa vez aconteceu nos acréscimos do segundo tempo, em jogo no Estádio Municipal Professor Dario Rodrigues Leite, em Guaratinguetá.
O árbitro Guilherme Drbochlaw relatou na súmula que acionou o protocolo antirracismo após um atleta do Manthiqueira sentar-se no gramado e, “aos prantos”, informar à equipe de arbitragem a ofensa da torcedora do time visitante: “Preto, filho da puta, sem família, vai tomar no cu”, teria dito a torcedora, segundo relatado pelo árbitro na súmula, com base na denúncia do atleta.
A Polícia Militar foi acionada e a mulher foi identificada e presa, sendo conduzida em seguida para a cadeia pública de Lorena.
“Uma mulher de 41 anos foi presa em flagrante por injúria racial contra uma criança de 12 anos durante uma partida de futebol, na tarde de domingo (19), na Praça da Bíblia, no bairro Parque Alberto Bayington, em Guaratinguetá (SP)”, informou a SSP (Secretaria de Segurança Pública), em nota.
“De acordo com o boletim de ocorrência, durante o jogo, uma das crianças informou ao árbitro que estava sendo alvo de insultos raciais vindos de uma mulher na arquibancada. O ato foi confirmado por um dos gandulas da partida. A mãe da vítima acionou os policiais que faziam a segurança do evento. As partes foram encaminhadas à Delegacia de Guaratinguetá, onde a suspeita prestou depoimento e teve a prisão em flagrante decretada. A mulher foi encaminhada à Cadeia Pública de Lorena, onde permaneceu à disposição da Justiça”, disse a secretaria.
“Após o ocorrido, o referido atleta não seguiu na partida devido ao seu estado emocional”, informou Drbochlaw na súmula.
Segundo o árbitro, um funcionário do Corinthians já havia se dirigido à torcida para pedir moderação nas manifestações, após atletas do Manthiqueira relatarem mau comportamento das arquibancadas durante a parada técnica do segundo tempo.
Entre o fim de agosto e o início de setembro, a FPF (Federação Paulista de Futebol) chegou a proibir a presença de público durante duas rodadas do Paulista sub-11.
A medida, de caráter educativo, foi tomada devido ao comportamento inadequado da torcida em múltiplos jogos. Os casos relatados incluíram ofensas aos garotos —com injúria racial e homofobia—, brigas e ameaças.
A FPF também lançou no fim de setembro um vídeo contra o mau comportamento dos pais durante as partidas, com relato de atletas mirins. “Não é legal xingar uma criança. Fiquei triste. Até chorei”, diz um deles.
“Não nos surpreende esse caso, porque a gente já vem monitorando casos de preconceito e intolerância em jogos das categorias de base. Mas nos assusta, porque estamos falando de meninos e meninas em formação”, afirmou Marcelo Carvalho, diretor executivo do Observatório da Discriminação Racial no Futebol, à Folha.
Levantamento do Observatório indica que, em 2024, foram cerca de 110 denúncias de casos de racismo identificadas —não há diferenciação entre jogos de base, profissionais ou amadores. Em 2023, haviam sido 136 denúncias.
Segundo Carvalho, as punições são medidas importantes, porém insuficientes para acabar com as práticas preconceituosas nos estádios.
Ele afirmou que é preciso um envolvimento maior dos próprios clubes, com ações educativas e de conscientização junto aos pais dos atletas, que são quem mais costuma estar presente nas arquibancadas em jogos da base.
“Se nada for feito, os meninos que ouvem essas ofensas hoje, amanhã podem estar reproduzindo elas”, acrescentou o diretor do Observatório.
A FPF manifestou “profunda indignação e revolta com mais um ato de racismo“.
“A FPF reforça seu repúdio a todo e qualquer ato racista e reafirma que o futebol paulista não tolera a participação de racistas em suas competições. Choca ainda mais o fato de, neste caso, ser um ato contra uma criança que apenas está jogando futebol”, disse a federação em nota. “A FPF seguirá vigilante e atuante para que nenhuma pessoa, muito menos crianças, sejam alvos de crimes como este.”
O Manthiquera e o Corinthians também condenaram a postura da torcedora.
“Ontem no jogo entre Manthiqueira x Corinthians houve um vencedor pelo placar, mas todos nós perdemos! Racismo é crime no futebol e na vida”, escreveu o clube.
“Autoridades competentes já estão cuidando do caso. Ontem foi um dia que, apesar de querermos esquecer, precisará ficar na memória de todos”, acrescentou.
“O Corinthians reforça seu repúdio a qualquer ato discriminatório e acompanha com atenção o desenrolar dos fatos, colocando-se à disposição das autoridades para colaborar no que for necessário”, informou o clube do Parque São Jorge.
O jogo, válido pelas quartas de final do torneio, terminou com a vitória do time alvinegro por 5 a 1.

