Se você já está há um tempo no mercado de trabalho, vai saber do que Gustavo Werneck está falando quando ele se refere a chefes que contratam pessoas com perfis iguais aos seus e que estressam suas equipes. Evitar esses dois erros está entre os aprendizados da carreira desse engenheiro mecânico nascido em Minas Gerais que hoje é CEO da Gerdau, maior empresa brasileira produtora de aço, e personagem deste segundo capítulo da newsletter Acelerador de Carreira.
Num setor em que as promoções costumam ser mais lentas, Werneck teve uma ascensão rápida: foi de gerente a CEO em 11 anos. Para chegar ao topo, a oportunidade de trabalhar na operação da empresa na Índia foi fundamental. Lá, o sucesso contou com o empurrão de um guru local — e acreditar no poder da mentoria é justamente uma das sugestões dadas por Werneck, que a seguir fala também sobre apoio da família e a importância de não estar preso a planos.
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Acelerador de Carreira #2 | Gustavo Werneck, da Gerdau
Você se formou em engenharia mecânica e em cinco anos já era gerente?
Sim. Me formei e comecei a trabalhar em Belo Horizonte para a SMS, empresa alemã de equipamento siderúrgico. Ali foi minha porta de entrada na indústria do aço. Entrei como engenheiro recém-formado e saí como gerente de engenharia. A vida foi meio acelerada lá, assim como depois que entrei na Gerdau.
As promoções no setor industrial não costumam demorar mais?
O que acontece é que, no setor de engenharia e da indústria, o mindset costuma ser diferente. Não é que faltem oportunidades: mutas vezes, elas não são aproveitadas na velocidade em que poderiam. Precisa ter uma cabeça de mudar a toda hora, de aceitar convites para mudar de cidade. Em geral, as pessoas dessa área tendem a ser mais resistentes a isso.
Quando saiu da SMS para a Gerdau, você fez um movimento lateral, pois foi ocupar exatamente o mesmo cargo, não?
Sim. Fui contratado para ser gerente de engenharia em uma usina da Gerdau no interior de Minas. Só que aí, faltando dez dias para eu começar, me ligaram da Gerdau e perguntaram se, em vez de ficar em Minas, eu toparia ir para uma usina no Rio de Janeiro. Nessa situação, talvez 90% das pessoas dissessem não. Eu disse: “só me fala o endereço e o dia que eu tenho que estar lá”.
A sua esposa também tem essa mentalidade de aceitar desafios?
Sim. De qualquer forma, as mudanças profissionais precisam ser muito bem discutidas em família. Caso contrário, em algum lugar a corda vai romper, seja na família ou na empresa. Ao longo dos meus 21 anos na Gerdau, vários problemas desses se materializaram. Aí dá sofrimento, conflito, separação, desilusão e tristeza.
Quando você entrou na Gerdau, aposto que não imaginava chegar a CEO.
Em workshops de RH, existem aqueles exercícios: “Imagine onde você estará em cinco anos, em dez anos…” Acho isso uma bobagem muito grande. Nunca fiz planos detalhados, tipo: “quero ser gerente em dois anos”. Sempre preferi deixar a vida acontecer, sabendo que as oportunidades surgiriam.
Você acha que isso te ajudou?
Sim. O pessoal fica tão bitolado com planos de querer virar diretor, CEO, que isso dificulta viver intensamente o seu dia-a-dia. Essa flexibilidade que eu tive vem de não estar preso a planos.
E deu muito certo. Em 11 anos você já era CEO da Gerdau.
Quando você trabalha numa empresa de controle familiar, tem uma palavra muito importante: confiança. Muitas vezes, coloquei a empresa em primeiro lugar. Todos os momentos em que a empresa precisou de mim, eu disse sim. Então, essa relação de confiança, que se tornou inquebrável, foi muito importante. Talvez a minha carreira acelerada venha de eu ter conquistado isso. Além disso, tem uma conjuntura da empresa, que não depende de você.
Sorte de estar no lugar certo na hora certa?
Sim. Naquele momento, a Gerdau estava em expansão e oferecia muitas oportunidades. Mas muita gente, por exemplo, tinha medo de ser convidada para trabalhar na operação da Índia. Lembro o dia em que meu chefe, um americano, ligou me fazendo o convite em inglês. Perguntei que dia ele queria que eu estivesse lá. Achando que eu não tinha entendido direito, ele refez a pergunta. De novo, respondi querendo saber a data para a chegada. Aí o chefe: “você não quer falar com a sua esposa?” Respondi que já tínhamos conversado sobre isso dez anos atrás — e que não me surpreenderia se ela chegasse antes de mim na Índia.
Por que as pessoas não queriam ir para a Índia?
O medo da mudança gera pânico. É uma cultura diferente, um ambiente, de certa forma, hostil para ocidentais. Tem a distância também. A nossa usina era longe da cidade onde a família ficava. Durante a semana, eu ficava ausente. Mas a gente sabia que era por um tempo, não pelo resto da vida.
Como você fez para liderar num ambiente tão diferente do brasileiro?
Dentro da caixa de ferramentas do RH, sempre valorizei o coaching e o mentoring. Por isso, uma das primeiras ações que tomei foi buscar um mentor indiano com visão ocidental, um guru que me explicasse como as coisas funcionavam lá. Em 90% dos casos, o jeito brasileiro de tocar as coisas não se aplicava, e ele me ajudou a ser mais certeiro nas decisões. Quando se trabalha fora do Brasil, ter um mentor local faz toda a diferença.
Era um empresário indiano dono de uma grande construtora, que conhecia o dia a dia e os negócios na Índia. Na mentoria, é preciso haver aceitação mútua — e ele também tinha interesse em entender a construção civil no Brasil, que em certa medida servia de inspiração.
Pessoas que sobem na carreira de forma muito rápida podem cair na ilusão de que tudo que fizeram estava certo. Quais cabeçadas você deu antes dos 35 anos que preferia não ter dado?
Antes, era um pouco mais ansioso. Hoje, acho que tão importante quanto você vencer uma batalha é preparar o seu time para a próxima. Olhando para trás, acho que, muitas vezes, estressei e cansei demais o meu time para buscar um nível de performance de curto prazo que me prejudicou. Aprendi que tem que ter um limite de busca por performance sem tirar a energia, sem drenar a motivação para os desafios futuros.
Gostava muito de contratar pessoas que são exatamente como eu. Isso ficava claro nas coisas que olhava na entrevista, nas perguntas que fazia. Na época, não tinha a capacidade de entender que pessoas diferentes, trabalhando em um time, conseguem entregar resultados muito melhores.
Quais conselhos você dá aos mais jovens?
Tento dar a eles uma visão um pouco mais pragmática das coisas. Há muito tempo, as universidades não dão o que é necessário para alguém alcançar o sucesso — seja qual for a definição de sucesso. Há engenheiros que saem da faculdade com ótimo conhecimento técnico, mas sem saber nada de gente, cliente, gestão. Então, estimulo muito as pessoas a buscar esses conhecimentos em experiências adicionais.
Isso inclui experiências pessoais?
Sim. Pego um exemplo do meu pai, que era o chamado “caixeiro viajante”, um representante comercial que atendia lojas de material de construção. Em viagens pelo norte de Minas e sul da Bahia, aprendi com ele a lidar com clientes com calma e atenção. Meu pai não entrava na loja de material de construção e já ia tirando o pedido. Ele conhecia todo mundo pelo nome, seus filhos, o time de cada um. Era muito organizado, tinha tudo anotado e estudava antes de entrar na loja. Só depois de meia hora de conversa tirava o pedido — mostrando que o relacionamento vem antes da venda. Essa lição me foi muito útil na Índia.
- Mudança profissional é assunto de família.
- Não se prenda a planos, cultive a flexibilidade.
- No exterior, um mentor local é essencial.
- Tão vital quanto vencer é poupar energia para a próxima.
- Não contrate um mesmo perfil: o time diverso entrega mais.