o trágico incêndio de Hong Kong

por Assessoria de Imprensa


Poderia ser em qualquer outro lugar, mas também tem características muito chinesas. Mais ainda, aspectos tipicamente de Hong Kong. A começar pela tradição milenar de construções com bambus, que também é considerada uma arte aqui. Neste caso, o uso de bambu em andaimes. Quem já foi a Hong Kong deve ter notado, eles estão por toda parte. O bambu é abundante no sul da China. É um material forte para sustentar pesos, e mais barato que metal. O problema, tragicamente claro neste caso, é que ele é inflamável.

Há também relatos de que outros materiais inflamáveis eram usados na construção, contra as normas de segurança, como plásticos e espumas. Esse é outra questão antiga de Hong Kong, concessões fraudulentas no setor imobiliário, para construção ou serviços de manutenção. Três responsáveis pelas obras foram presos por negligência, mas a investigação de verdade sobre as causas do incêndio ainda não começou.

Hong Kong, ex-colônia britânica, fica a mais ou menos 3 horas e meia de voo de Pequim. Faz parte da China, mas é definida como região administrativa especial, em tese mantendo um caráter semiautônomo sob o lema “um país, dois sistemas”. Quando o território foi devolvido pelo Reino Unido em 1997, após um século e meio de dominação colonial, havia o compromisso de manter o sistema jurídico por 50 anos. Mas isso mudou com as reformas aprovadas em Pequim após os protestos pró-democracia de 2019, que reduziram drasticamente o espaço para contestar decisões do governo.

O incêndio no conjunto residencial Wang Fuk Court torna-se o primeiro desafio com alta visibilidade da suposta autonomia jurídica concedida pela separação entre os “dois sistemas”. É também um teste para a capacidade da imprensa de Hong Kong de cobrar uma apuração transparente das causas da tragédia. Para muitos moradores do território, a negligência que permitiu o incêndio está associada aos protestos que sacudiram Hong Kong na última década. As manifestações que começaram em 2014 e explodiram de vez em 2019 ficaram mais conhecidas pela defesa da democracia. Mas tinham um fundo social importante também, ligado à questão da moradia em Hong Kong, ao direito à habitação digna.

Cidade com uma das mais altas densidades populacionais do mundo, Hong Kong também quase sempre aparece no topo dos rankings de cidades mais caras. Milhares de pessoas vivem em microapartamentos, alguns compartilhados por várias famílias. O problema sempre existiu, mas se agravou depois da transferência do território, em 1997, seguida pela crescente migração de capital e de gente endinheirada da China continental, além da lavagem de dinheiro. O incêndio deflagrou uma onda de solidariedade em Hong Kong, mas também reacendeu a revolta contra a desigualdade social da cidade, que se mantinha reprimida desde a aprovação da Lei de Segurança Nacional, em 2020.



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