Enquanto representantes dos Estados Unidos e da Ucrânia se reuniam neste domingo em Genebra para discutir a proposta americana para o fim da guerra entre Kiev e Moscou, que já se aproxima de seu quarto ano, o presidente Donald Trump voltou a acusar a liderança ucraniana de não demonstrar “gratidão” pelo apoio oferecido por Washington desde o início do conflito. A declaração do mandatário, feita nas redes sociais, foi rapidamente seguida pela do presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, que direcionou elogios pessoais ao republicano:
“A Ucrânia é grata aos Estados Unidos, a cada coração americano e, pessoalmente, ao presidente Trump pela assistência que — começando com os (mísseis antitanque) Javelins — vem salvando vidas ucranianas (…). Obrigado a todos que estão ajudando. Obrigado, América! Obrigado, Europa!”, escreveu Zelensky. Mais cedo, Trump havia dito que “herdou” uma guerra que “nunca deveria ter acontecido”, acrescentando que “a ‘liderança’ da Ucrânia não expressou qualquer gratidão pelos nossos esforços, e a Europa continua comprando petróleo da Rússia”.
Enquanto isso, o secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, se encontrava com a delegação ucraniana, liderada por Andriy Yermak, e autoridades de alto escalão do Reino Unido, França e Alemanha — representantes de um bloco europeu que, excluído da criação do rascunho inicial do plano americano, agora busca garantir um lugar na mesa de discussões. Trump havia dado a Kiev até 27 de novembro para aceitar a proposta, mas a Ucrânia pede mudanças significativas no documento, que contempla duras exigências da Rússia — como a cessão de território, a redução das Forças Armadas ucranianas e o compromisso de que o país jamais ingressará na Otan.
No sábado, Trump disse a jornalistas que sua proposta não era a “oferta final” e manifestou esperança de interromper os combates “de um jeito ou de outro”, afirmando que isso poderia reforçar a posição negociadora de Kiev. À AFP, um funcionário americano disse que “diversas reuniões” foram feitas neste domingo, com as delegações realizando “discussões detalhadas sobre o acordo de paz”. Mais tarde neste domingo, porém, o chanceler alemão, Friedrich Merz, afirmou estar “cético” de que um acordo seja possível até o prazo estabelecido pela Casa Branca.
O negociador ucraniano Rustem Umerov, por sua vez, afirmou que a versão mais recente do rascunho do plano americano “já reflete a maioria das principais prioridades da Ucrânia”. Zelensky também escreveu nas redes sociais que as “propostas americanas podem incluir vários elementos baseados em perspectivas ucranianas e críticos para os interesses nacionais da Ucrânia”, comemorando que a “diplomacia foi revigorada”.
‘Discussão ampliada’
A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, disse em nota que a “centralidade” da União Europeia (UE) precisa estar “plenamente refletida” em qualquer plano de paz, e repetiu que a Ucrânia tem o “direito soberano” de escolher seu próprio destino. Líderes europeus reunidos na cúpula do G20, na África do Sul, afirmaram que o plano dos EUA ainda requer “trabalho adicional”, enquanto o presidente da Finlândia, Alexander Stubb, disse ter conversado com Trump ao lado da primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, sobre o plano.
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Já o francês Emmanuel Macron afirmou que pontos ligados à Otan e aos ativos russos congelados na UE precisam de discussão ampliada. Ele informou que os 30 países da chamada “coalizão dos dispostos” farão uma videoconferência na terça-feira, após as reuniões em Genebra. Países da UE planejavam também discutir a guerra na Ucrânia em encontro paralelo com líderes africanos em Angola na segunda-feira.
As discussões ocorrem em meio a questionamentos sobre o nível de influência de Moscou no projeto americano. O Kremlin recebeu positivamente o rascunho inicial, e o presidente russo, Vladimir Putin, disse que o plano poderia “lançar as bases” de um acordo final de paz — ao mesmo tempo em que ameaçou expandir o controle territorial russo caso Kiev abandonasse as negociações. Antes da reunião de domingo, Washington reiterou que a proposta representava a política oficial dos EUA e rejeitou alegações de senadores americanos segundo as quais Rubio teria dito que o texto refletia uma “lista de desejos” russa.
Neste domingo, o primeiro-ministro da Polônia, Donald Tusk, disse que, embora Europa, Canadá e Japão estivessem dispostos a trabalhar no plano de 28 pontos, “seria bom saber com certeza quem é o autor do plano e onde ele foi criado”. Diante da polêmica, Rubio afirmou que o documento foi elaborado pelos EUA, com contribuições tanto da Rússia quanto da Ucrânia.
Apesar dos entraves, até agora Trump manteve o prazo de 27 de outubro — feriado de Ação de Graças nos EUA — para aprovar o documento, ainda que tenha sinalizado que poderia haver alguma flexibilidade. Desde o início de seu segundo mandato, em janeiro, a posição do americano sobre a guerra na Ucrânia oscilou de forma drástica. O bilionário republicano, que inicialmente prometeu encerrar o conflito em “24 horas”, passou de elogiar o presidente russo e chamar Zelensky de “ditador” a impor sanções pesadas a Moscou e dar sinais de apoio à retomada de território pela Ucrânia. (Com AFP)

