Milhares de vacas prenhes seguem confinadas em um navio de cargas que está à deriva há quase dois meses, depois de ter sua entrada negada no porto de Bandirma, na Turquia. Imagens e relatos de moradores locais descrevem um cenário de forte odor e enxames de moscas em torno do Spiridon II, onde animais continuam morrendo e dando à luz em meio a fezes e acúmulo de sujeira.
O cargueiro, de bandeira do Togo, transporta cerca de 2.900 cabeças de gado distribuídas nos porões abafados. De acordo com o The Sun, testemunhas relataram a presença de grandes sacos no convés, supostamente contendo carcaças de vacas, de onde vazavam fluidos corporais e membros eram visíveis. A embarcação deixou Montevidéu, capital do Uruguai, em 20 de setembro, com previsão de desembarque na Turquia em 22 de outubro.
Problemas burocráticos e impasse no porto
Ao chegar ao destino, a tripulação não recebeu autorização para descarregar o gado devido a inconsistências encontradas nas etiquetas auriculares e nos registros de parte dos animais. Diante do veto, o navio foi obrigado a permanecer ancorado em alto mar por quase um mês, ampliando a preocupação com as condições sanitárias a bordo. Segundo a Fundação de Bem-Estar Animal, com sede na Alemanha, ao menos 58 vacas já morreram desde o início da jornada.
A organização afirmou que a maioria das vacas eram novilhas prenhes e que cerca de 140 filhotes nasceram durante a travessia. Pelo menos 50 bezerros foram identificados, sem confirmação de sobrevivência, enquanto o paradeiro de outros 90 permanece desconhecido. A entidade alertou ainda para a queda acelerada nos estoques de comida e água, indicando que os animais podem não estar recebendo qualquer cuidado adequado.
Pressionadas internacionalmente, autoridades turcas permitiram uma atracação temporária para reabastecimento, mas determinaram que o Spiridon II retornasse ao Uruguai logo em seguida. A viagem de volta deve durar cerca de 32 dias, o que empurrará a situação para meados de dezembro. Enquanto isso, as condições permanecem críticas. “Após a longa viagem do Uruguai para a Turquia, os animais já estavam debilitados. Cada novo atraso significa sofrimento imenso”, afirmou a veterinária Dra. Maria Boada Saña, da Fundação de Bem-Estar Animal, ao The Sun.
Especialistas ouvidos pela organização reforçam a gravidade da situação. A veterinária australiana Lynn Simpson, referência em transporte marítimo de animais vivos, avaliou que as reservas de água, forragem e cama “provavelmente estão escassas ou inexistentes”, especialmente após uma jornada muito mais longa que o previsto. “Suspeito que o abastecimento de água seja baixo ou de qualidade duvidosa se a embarcação permanecer ancorada”, declarou.
Boada Saña acrescentou que o caso “exemplifica o sistema de exportação de animais vivos em alto mar” e alerta para a probabilidade de novas tragédias enquanto esse tipo de transporte seguir permitido. Construído em 1973 e convertido para o transporte de gado em 2011, o Spiridon II dispõe de cerca de 4 mil metros quadrados destinados aos animais — espaço que tem se mostrado insuficiente diante do longo período de confinamento.

