por que o corpo e a mente sofrem mais no começo da semana?

por Assessoria de Imprensa


Domingo à noite, a trilha sonora do Fantástico dá o tom e a sensação de fim: é hora de dormir. Na manhã seguinte, quando o alarme toca, avisa lá no fundo da mente: “É segunda-feira, dia de ir trabalhar/estudar, chegou mais uma semana”. Neste momento, não tem quem não reclame — queria que o fim de semana durasse mais. Essa decepção se traduz fisicamente e estudos indicam maior risco de infartos, AVCs e aumento de ansiedade.

Segundo especialistas, a “maldição da segunda-feira” é um fenômeno que mistura ritmos biológicos, profissionais e até mesmo a insatisfação das pessoas com a própria rotina. A segunda-feira, normalmente, é a ideia do retorno a uma estrutura de vida de trabalho, estudo, cursos e atividades.

Esse retorno é o oposto da ideia do fim de semana, de liberdade e prazer. Para André Machado, doutor em psicologia clínica e neurociências pela PUC-Rio, a volta é o encontro entre possibilidades diferentes.

— É o cérebro se chocando com dois mundos opostos. No fim de semana, a gente relaxa, com tempo para o que dá prazer real, como um churrasco com amigos ou um filme sem hora para acabar, e isso baixa a tensão. Na segunda, o trabalho puxa de volta para demandas, prazos e rotinas que nem sempre energizam, criando uma ansiedade que vem da sensação de perda de controle — afirma.

E esse “choque” se torna maior para quem está insatisfeito com o trabalho. De acordo com uma pesquisa da International Stress Management Association (ISMA-BR), divulgada em 2023, 72% dos profissionais brasileiros afirmam se sentir insatisfeitos.

O “medo” de enfrentar o primeiro dia útil da semana vai além dos processos relacionados à mente humana. O corpo também sente esse momento chegar, seja com dores ou irritações, simplesmente pelo fim do domingo. Assim, a pessoa tem a sensação que não aproveitou o suficiente e passa a achar a segunda-feira péssima. O corpo responde com tensão, e o pensamento negativo é reforçado.

— As reações muitas vezes intensas de ansiedade, angústia, depressão pelo simples fato de o final de semana acabar já vêm no anoitecer de domingo. Há pessoas que relatam sintomas como dores musculares e dores de cabeça, por exemplo —diz Ana Maria Rossi, psicóloga e presidente do ISMA-BR.

Segunda traz mais problemas de saúde

Uma pesquisa irlandesa, em que foram analisados casos de 10.528 pacientes internado entre 2013 e 2018, apontou que o risco de infarto é 13% maior no primeiro dia útil da semana.

Um dos motivos seria o aumento do estresse devido à volta ao trabalho depois de um fim de semana de descanso. Outros estudos apontam a alteração do ritmo circadiano, o ciclo de sono e vigília, como possível causa.

Ana Maria Rossi referenda que a segunda-feira é o dia mais “perigoso” para a semana em relação à saúde:

— Existem mais acidentes de trabalho na segunda-feira, mais ataques cardíacos, a incidência de derrames e AVCs é maior. Então, realmente existe esse receio.

Estudo publicado na revista científica Journal of Affective Disorders revelou que idosos que sentem ansiedade às segundas-feiras apresentam níveis significativamente mais altos de estresse a longo prazo, mesmo quando já não estavam trabalhando. A pesquisa é considerada a primeira a identificar a segunda-feira como um fator de estresse biológico persistente.

Quem trabalha, normalmente, vê a segunda-feira como um "martírio", porém existem caminhos para pensar o contrário — Foto: Freepik
Quem trabalha, normalmente, vê a segunda-feira como um “martírio”, porém existem caminhos para pensar o contrário — Foto: Freepik

No trabalho, aqueles que relataram sentir ansiedade às segundas apresentaram níveis de cortisol 23% mais altos dois meses depois, em comparação com quem se sentiu ansioso em outros dias. A exposição prolongada a níveis elevados desse hormônio está ligada a maior risco de doenças cardiovasculares, resistência à insulina e disfunções do sistema imunológico.

O mesmo estudo também constatou que apenas 25% do efeito da segunda-feira se deveu aos níveis mais altos de ansiedade relatados no mesmo dia. Os 75% restantes decorreram do impacto fisiológico desproporcional da ansiedade de segunda-feira em comparação com a ansiedade em outros dias. Os pesquisadores propõem que a exposição prolongada a uma rotina semanal estruturada pode condicionar o corpo a responder mais fortemente à ansiedade no início da semana.

Estratégias para lidar com esse dia

Há formas de fazer com que o início da semana seja mais ameno. Para os especialistas, pequenas mudanças no ritmo de sono, nas expectativas e até na forma de encarar o trabalho podem reduzir o impacto emocional e físico desse início de semana.

— A pessoa pode programar o domingo para não ter muitos exageros, como fazer churrasco e beber além da conta. Se tiver compromissos que sejam motivadores, que despertem atenção e interesse da pessoa, que ela, na medida do possível, marque para a segunda-feira. Além disso, procurar fazer uma atividade física, um hobby, um encontro com os amigos — diz Rossi.

Já para André Machado, coisas como manter uma higiene adequada do sono e planejar bem o domingo, com horários fixos de acordar e dormir, podem fazer toda a diferença para vencer a “maldição” da segunda-feira.

— Transforme o domingo à tarde em aliado: revise a agenda da semana com calma, definindo blocos de tempo para tarefas essenciais e pausas intencionais, como 10 minutos de alongamento entre reuniões, o que evita o efeito avalanche de demandas e dá ao cérebro um mapa claro, diminuindo a ruminação noturna — diz.

O segredo pode não ser uma segunda-feira perfeita, mas menos punitiva. Aceitar que a semana começa, dar pausas ao corpo e reservar um momento de prazer logo no início do dia podem mudar o tom da rotina.

Os “memes” da segunda-feira nas redes sociais

Se na hora de fazer piadas nas redes sociais gera likes e debates entre as pessoas nas redes. Até na hora da “dor”, muitos não perdem a chance de fazer uma brincadeira, e trazer mais humor e leveza ao início da semana. Memes e vídeos dão a tônica do que é começar a semana. André Machado fala que isso pode ajudar a baixar a tensão das pessoas que precisam ir trabalhar ou estudar.

— Muito do que sentimos é moldado pelo que vemos ao redor: as piadas sobre “segunda-feira, o dia que mata sonhos” viraram folclore moderno, um sofrimento compartilhado que ajuda a criar vínculos, transformando o isolamento em uma rede, em um sentimento coletivo de “nós contra o calendário”, o que alivia na hora, tipo um desabafo coletivo que faz rir e pensar “não sou só eu” — afirma ele.

Mas ele faz uma ressalva: o riso pode aliviar a tensão, mas também reforçar o próprio mal-estar. Ao normalizar o cansaço e transformar a exaustão em piada semanal, essa cultura das redes sociais pode mascarar o problema, caso a pessoa venha a ter um de fato.

— Essa cultura de exaustão glorifica o “sofrer junto” como uma espécie de troféu, o que pode travar mudanças reais, transformando o descontentamento em rotina aceita — assegura André Machado.

*Estagiário sob supervisão de Constança Tatsch



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