O anúncio do presidente Lula de que o governo federal planejava ceder legistas da Polícia Federal (PF) para as investigações sobre as 121 mortes na megaoperação policial no Rio de Janeiro no último dia 28 pegou aliados de surpresa e deixou integrantes da gestão petista incrédulos. Isso porque não houve nenhum planejamento elaborado nesse sentido pelo Ministério da Justiça ou pela PF.
A fala do presidente ocorreu em entrevista a veículos estrangeiros na Base Naval de Val de Cães, em Belém, onde o petista participará da cúpula dos chefes de Estado da COP30 a partir da próxima quinta-feira (6).
“Nós estamos tentando ver se é possível os legistas da Polícia Federal participarem do processo de investigação da morte, como é que foi feito. Vamos ver se a gente consegue fazer essa investigação. Porque a decisão do juiz era uma ordem de prisão. Não tinha uma ordem de matança e houve a matança”, disse Lula.
“As pessoas podem considerar um sucesso, mas, do ponto de vista da ação do estado, eu acho que ela foi desastrosa”.
Ninguém no governo entendeu a declaração do petista, já que a proposta não havia sido discutida internamente em nenhuma das instâncias cabíveis. O espanto não se deu apenas no núcleo político, mas também nas equipes à frente das políticas de segurança pública do governo federal.
A equipe da coluna entrou em contato com três fontes ligadas ao governo e à PF após o anúncio de Lula e confirmou que não houve qualquer pedido por parte do presidente da República. E nem haverá.
Mesmo depois da fala, ninguém recebeu pedido do petista para providenciar os tais legistas às investigações no Rio. Mesmo com a liberação de todos os corpos pela perícia do Instituto Médico Legal (IML) fluminense para o sepultamento, os agentes da PF poderiam apurar trajetórias de balas e outras referências técnicas para aferir em quais condições se deram as mortes dos 117 suspeitos, além de dois policiais civis e outros dois policiais militares.
O assunto é dado como encerrado nos círculos do governo, apesar do anúncio pomposo que se revelou mais uma declaração desastrada do petista no contexto da operação liderada pelo governo Cláudio Castro (PL).
A definição da operação como “desastrosa” e a menção a “matança” pelo presidente também atropelou uma tentativa de armistício entre Castro e Lula costurada entre os governos do Rio e o federal, como mostramos no blog.
O governador bolsonarista vinha tentando uma aproximação com o presidente há alguns meses, para tentar resolver um problema de ordem financeira. Castro precisa do governo federal para poder aderir ao Propag, programa de renegociação de dívidas com a União. O Regime de Recuperação Fiscal para o Rio só vale até o próximo dia 31. Se não conseguir renegociar, o estado pode ter que pagar juros altos que tornariam sua situação financeira insustentável.
Castro não gostou das declarações de Lula, mas preferiu não responder para não confrontar o presidente no momento da renegociação, além de estar ocupado com o julgamento da ação que pede sua cassação por abuso de poder econômico no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

