Inédita, a obra é ainda um esboço no qual Nuno Ramos, impactado com a matança, está trabalhando agora.
O artista também escreveu um texto que explica um pouco mais sua nova obra:
“Anteontem, acordei para nosso pesadelo recorrente – o assassinato de mais de 64 pessoas (entre eles, 4 policiais), em plena luz do dia, sob a metralha da polícia. Ontem, para o segundo ato da tragédia – mais de setenta corpos fuzilados e esquecidos na mata, recolhidos pela própria população, colocados na caçamba de uma perua e estirados no chão da praça para reconhecimento de mães, irmãs, parentes. Este indizível (que sequer os trágicos gregos souberam dizer) é o Eterno Retorno, o loop brasileiro que me perseguiu ao longo de toda a minha vida adulta: gente pobre, preta, jovem, sendo baleada impunemente. O ritornelo infindável desta cena, como um túnel sem luz no fundo, assombrou, além de minha própria existência, toda a vida democrática desde a Constituinte, sendo talvez seu porão secreto (como a Ditadura, a Democracia também criou o seu). A eliminação intencional – racial, etária, de classe – da parte mais abandonada da população é o contrapeso macabro, mas exposto à luz do dia, às conquistas que a democracia de fato alcançou. Para cada vaga no SUS, para cada escola exemplar em Sobral, um jovem preto, pobre, baleado, que “fita com o olhar langue/ e cego os céus perdidos.” Venho tentando realizar o trabalho que a imagem acima simula (neste caso, em frente à Candelária e numa rua da Maré). Seriam 10 out-doors torcidos, quebrados, espatifados, sofrendo a violência que procuram negar. Espalhados pela cidade, diriam, num Decálogo de um Mandamento só, aquele único que importa, e que precisa ser repetido todos os dias: Não matarás, Não matarás, Não matarás, Não matarás, Não matarás, Não matarás, Não matarás, Não matarás, Não matarás, Não matarás.”

 
														