Trem do Pantanal: 50 anos e 57 regravações

por Leandro Ramos


Música que nasceu em viagem já passou da viola para a bateria e terminou em remix; canção fez 50 anos

Do rock ao eletrônico, Trem do Pantanal já foi regravada 57 vezes
Vagão do Trem do Pantanal em Aquidauana, em 2024 e 2016 (Foto: Ronald Regis/ O Pantaneiro e Arquivo pessoal)

O que parecia mais uma viagem de amigos em busca de um quadro peruano virou berço de uma das músicas que se tornou um dos hinos de Mato Grosso do Sul. Meio século depois a aventura de Geraldo Roca e Paulo Simões foi regravada 57 vezes. Este ano a composição completa 50 anos e segue sendo cantada do rock até ao eletrônico. De uma coisa é fato, quem não gravou se arrependeu.

“Trem do Pantanal”, hino de Mato Grosso do Sul, completa 50 anos e acumula 57 regravações, transitando por diversos gêneros musicais, do rock ao eletrônico. A canção, composta por Geraldo Roca e Paulo Simões em 1975 durante uma viagem de trem, tornou-se um clássico da música regional brasileira. A versão de Almir Sater, lançada em 1982, impulsionou a música nacionalmente. Outras regravações, como a de Diana Pequeno no mesmo ano e a versão rock do Bando do Velho Jack, expandiram o alcance da canção para diferentes públicos. Artistas como Renato Teixeira, Luan Santana e Michel Teló também interpretaram “Trem do Pantanal”, consolidando seu status de patrimônio cultural. Em 2024, um remix da DJ Nathalia Albuquerque e Jay Jenner trouxe uma roupagem contemporânea à música, reforçando sua atemporalidade e capacidade de conectar gerações.

Em 1975, dois jovens pegaram o Trem do Pantanal rumo a Santa Cruz de La Sierra, tiraram de baixo do banco um violão e fizeram a canção que mais tarde ganhou o país. O Lado B resgatou essa história em outras duas matérias. Você pode conferir neste link ou clicando aqui.

A quantidade de regravações sempre foi uma dúvida para o público e para os próprios muitos artistas, por isso o Ecad (entidade brasileira responsável pela arrecadação e distribuição dos direitos autorais das músicas) esclareceu de uma vez por todas.

Pelas leis de proteção de dados não é possível saber quais bandas ou músicos regravaram. Mas por aqui há uma lista de pessoas que fizeram história com ela, inclusive enquanto Geraldo ainda estava vivo. O cantor faleceu em 2015 depois de ter tirado a própria vida.

Do rock ao eletrônico, Trem do Pantanal já foi regravada 57 vezes
Trio Hermanos Irmãos refizeram trajeto de Geraldo Roca e Paulo Simções no Tem do Pantanal (Foto: Arquivo pessoal)

Desde que foi lançada, o “Trem do Pantanal” ganhou diferentes interpretações, mas duas versões se destacaram: a gravação de Diana Pequeno, lançada em 1982, e a do Almir Sater. Apesar da cantora ter sido a pioneira, a regravação não saiu como esperava e não teve grande repercussão comercial. Já a de Almir, lançada no disco de estreia do cantor, transformou a música em um sucesso nacional. A canção também foi apresentada ao público em 1982.

Tanto Paulo Simões quanto Geraldo gravaram a música em projetos solo. O cantor e amigo da dupla Renato Teixeira relembrou que apesar de cantar  Trem do Pantanal em todo show em homenagem ao Roca, não chegou a gravar a música. Inclusive isso é motivo de arrependimento.

“Conheci a música antes de todo mundo. Primeiro fiquei amigo do Paulo, depois do Roca e por último do Almir. Quando eu conheci o Simões, eu não conheci o Trem do Pantanal, só vim conhecer o Roca. E ele foi um dos meus melhores amigos. Eu tive uma oportunidade rara e perdi de gravar Trem do Pantanal antes do Almir. Confesso que não caiu a minha ficha que eu poderia gravar a música e se transformar em um clássico, porque bela sempre foi e o cavalo passou arreado e eu não montei. Mas foi bom porque o Almir gravou e se transformou no primeiro grande sucesso dele”.

Para ele, a canção é importante pela beleza da melodia, pela composição e pela representatividade de mostrar uma região do Brasil.

“Ele era um grande cantor. Gravei com a Roca Romaria e gravamos juntos o Trem. Tenho orgulho de fazer parte desse time que tem o Trem do Pantanal como um hino, ela no fundo,  pertence a todos nós. O Roca se foi, mas nós estamos aí segurando a bandeira para o trem não parar nunca”.

Na voz do Bando do Velho Jack, a música ganhou outra cara, atingindo novos públicos. O sucesso foi tamanho que popularizou ainda mais a canção. O vocalista Rodrigo Tozzette explica que ter cantado a música nesse estilo mudou a “fama” da banda.

“A nossa versão de Trem do Pantanal teve uma aceitação muito boa do público, inclusive não só do público do rock aqui da região, até fora do estado, porque é uma coisa inusitada, uma banda de rock do Pantanal. Na verdade, esses artistas da música regional, a nossa conexão com eles é maior do que se imagina. Porque o Geraldo Roca, Paulo Simões, a família Espíndola, o Geraldo, Celito, até o próprio Almir, eles têm influência roqueira também”.

De acordo com Rodrigo, a música dos artistas citados é uma fusão da música fronteiriça, paraguaia, da guarânia, com o rock nacional, rock inglês e folk. “Isso faz com que o nosso rock com a música deles seja um caminho muito mais estreito do que a gente imagina. Tanto o Roca quanto o Simões, eles gostaram muito da nossa versão. O Paulinho até hoje, quando tá no show a gente chama para cantar com a gente Trem do Pantanal. Sempre foi uma ocasião muito festiva para eles”.

Segundo o músico, o apego dos mais novos pelas canções regionais têm mudado e vem crescendo ao longo dos anos. “O estado vai criando identidade e aí vai tendo mais pessoas que vão gostando do que é daqui. Com certeza ter feito a versão das músicas regionais no Rock criou, assim, um vínculo maior”.

Almir conta à cantora e apresentadora e da TV Cultura nos anos 90, Inezita Barroso, que Trem do Pantanal foi uma das primeiras músicas que aprendeu a tocar na viola. Por desencontro da agenda, o artista não pode atender a reportagem.

Em 2O16, o  jornalista e músico Rodrigo Teixeira, , junto a banda Hermanos Irmãos,  refez o caminho dos amigos Paulo e Roca fizeram em 1975. Eles saíram de trem de Puerto  Quijarro, na Bolívia, passaram por La Paz, Lago Titicaca, Cusco (Peru), Águas Calientes e

Machu Picchu. Na época o trem da parte boliviana ainda funcionava no transporte de passageiros. Hoje ele sobrevive apenas no carga. No caso deles também houve trechos feitos de carro e avião também.

“A gente fez um novo arranjo, que não tem nada a ver com as versões anteriores e o original da música. Buscamos fugir do arranjo do Almir e renovar a canção com um produtor de fora que não tinha na memória as versões anteriores. Trem do Pantanal é uma canção símbolo, que serviu de inspiração para várias gerações musicais de Mato Grosso do Sul e continua até hoje. Ter refeito em 2016 com o Hermanos Irmãos no mesmo caminho que o Simões e o Roca fizeram  quando compuseram só fez esta composição ficar ainda mais inspiradora para mim.”

Para quem não conhece a história, o trem ganhou o apelido de “trem da morte” quando passava para parte boliviana. Ele era usado para levar  doentes. Além disso, era conhecido pela estrutura precária e roubos. Teixeira explica que foi uma viagem tranquila e que encontrou outro artista regional no caminho. Ou seja, nada de Trem da Morte naquele ano.

“Foi uma festa rumo a Santa Cruz de La Sierra. A viagem serviu para quebrar este estigma e o medo que é comum no Brasil. Acredito que este título foi um reflexo daqueles anos 70 de Ditadura, que foi o que inclusive inspirou o Roca nesta canção quando cita ‘mais um fugitivo da guerra”.

Em entrevista ao livro “Pratas da Casa”, feito pelo jornalista, Geraldo Roca diz que a música Trem do Pantanal chegou a participar de um concurso chamado Fesul, em 1980, mas não ganhou. Quem levou a melhor foi o Grupo Acaba, que também compunha sobre a ferrovia.

 “A música foi retirada da final porque a letra foi considerada subversiva. Ou seja, alguém entendeu a letra naquela época, o que não aconteceu depois. Segundo a professora Glorinha, quem disse isso foi Onésimo Filho”.

De acordo com o cantor na época, julho de 2012, o pico da música aconteceu em 1982 quando Almir Sater regrava a canção. “Ele ficou martelando todo domingo no programa do Rolando Boldrin. Eu falava ‘Gente, a plateia vai começar a jogar tomate, não é possível. Mas foi mais ainda por causa da novela Pantanal”.

Ele conta que notícias sobre as pessoas e outros estados estarem ouvindo música pegava ele de surpresa, mas que achava tudo muito engraçado. “Em 1982 minha prima foi para São Paulo de ônibus e uma menina estava cantando Trem do Pantanal. A música não era conhecida e uma galera estava cantando. Achei engraçado”.

Para mostrar a capacidade da música de dialogar com outros estilos, em 2024 a DJ Nathalia Albuquerque e o cantor Jay Jenner criaram um remix do Trem do Pantanal. O vídeo já soma inúmeros comentários no Youtube. Durante as gravações do webclipe o cantor e um dos autores da canção, Paulo Simões esteve presente.

A DJ conta que fazer a releitura da música é uma forma de homenagem às raízes com um toque contemporâneo e mostrar que o eletrônico pode sim estar inserido em outros generos musicais. A obra deu o “start” a um projeto de remixes de músicas regionais.

“Pra mim é uma música muito especial porque eu cresci ouvindo música regional, especialmente Almir Sater e Paulo Simões. Meu pai tem uma amizade com Almir Sater e isso fez com que eu crescesse ouvindo as músicas dele. Ela é uma música muito especial porque ela me traz essa memória, essas lembranças, eu escutando música com meu pai”.

Para ela a música é ainda mais significativa por ser uma profissional nascida e criada em Mato Grosso do Sul e por deixar mais uma opção para as novas gerações não deixarem a canção “morrer”.

“Com muito orgulho eu quis dar início a esse projeto, justamente com essa música que eu acho que ela é muito emblemática para o nosso estado e muito especial para mim. Sem contar que o quanto isso é importante também para as gerações, porque é muito engraçado o quanto eu escuto falar que os filhos começaram a escutar a música e passaram a gostar. Então isso para mim também tem um significado enorme, trazer essa nova roupagem de uma música que é tão antiga para as novas gerações também conhecerem”.

Importante lembrar que figuras como Luan Santana e Michel Teló também cantaram a música em anos anteriores.

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